

Foto: Yara Nardi/Reuters
Desde seus primórdios, a Igreja compreendeu que o rito para o momento da morte e sepultamento do corpo eram de grande importância, visto que refletiam a fé cristã na ressurreição. Se sabemos que a morte corporal é apenas uma etapa para chegar à vida eterna, essa genuína esperança cristã precisava estar expressa em seu rito. Com um Papa, isso era ainda mais necessário. O Vigário de Cristo na Terra precisava ser sepultado de modo que expressasse o grande respeito por aquele momento de perda, mas também a esperança genuína na promessa cristã da salvação e da ressurreição. Sendo assim, o rito das exéquias foi sofrendo modificações ao longo do tempo, até chegar às etapas estabelecidas em um dos documentos mais recentes, que foi empregado em 1978 para as exéquias de São Paulo VI e do Beato João Paulo I. Trata-se do De funere Summi Pontificis. Desse modo, quando um Papa falece, o mundo se volta para o Vaticano, onde um complexo e solene ritual é realizado para marcar o fim de seu pontificado.
O funeral de um Papa não é apenas um evento religioso, mas também uma cerimônia cheia de tradições, simbolismos e protocolos. Em 5 de fevereiro de 1998, São João Paulo II aprovou o Ordo Exsequiarum Romani Pontificis, que fazia algumas alterações ao rito anterior. O advento das novas mídias fez surgir a necessidade de regular com exatidão os meios de comunicação, para que não seja desrespeitoso e invasivo em relação à sacralidade do momento da morte de um Papa, São João Paulo II também estabeleceu mais uma constituição apostólica sobre o tema, a Universi Dominici Gregis. A constituição trata especialmente da vacância da Sé apostólica e da eleição do Romano Pontífice. Mas, de forma especial, seu quinto capítulo está destinado a realizar algumas considerações sobre as exéquias papais, especialmente voltadas à mídia, que você encontrará descritas no próximo tópico. Outra mudança foi aprovada em 29 de abril de 2024, uma segunda edição típica do Ordo Exsequiarum Romani Pontificis, introduzindo novidades quanto ao local da constatação da morte, a deposição imediata dentro do caixão, a exposição do corpo do Papa à veneração dos fiéis já dentro do caixão aberto, a eliminação dos tradicionais três caixões: de cipreste, chumbo e carvalho.Tendo presente os documentos mencionados, entenda como funciona o funeral de um Papa, os principais rituais envolvidos e o que acontece após sua morte. Os documentos oficiais apresentam as etapas do funeral em três estações.
Primeira Estação: Na casa do Pontífice defuntoA primeira estação, como disposto no título, ocorre na casa pontifícia e compreende três momentos: Constatação da morte (Constatazione della morte); Exposição do corpo (Esposizione della salma); e Celebração e orações (Celebrazioni e preghiere). No momento imediato da morte, já estão presentes o cardeal camerlengo da Santa Igreja Romana (aquele que assumirá a administração de assuntos temporais da Sé Apostólica durante o período da Sé Vacante, com exceção da morte de Bento XVI, cujo sucessor já estava escolhido), o Substituto da Secretaria de Estado, o Mestre das Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice, os Prelados clérigos, o Secretário da Câmara Apostólica, os familiares ( se possível) e o médico, diretor dos serviços 1
Por: Pe. Dr. Gerson Figueiredo (Clero da Arquidiocese de Feira de Santana)
sanitários do Estado da Cidade do Vaticano. O corpo é preparado e vestido com as respectivas vestes papais, e ocorre a primeira exposição no lugar preparado na casa pontifícia, para que alguns fiéis que habitam o Vaticano e clérigos próximos expressem seus pêsames e sua oração pelo Santo Padre falecido. Segunda estação: na Basílica Vaticana
A segunda estação, ocorrem mais três importantes momentos: Translado do Sumo Pontífice para a Basílica Vaticana (Traslazione della salma del Sommo Pontefice nella Basilica Vaticana); Celebrações e orações (Celebrazioni e preghiere); e Missa de exéquias (Messa Esequiale). No dia e hora estabelecidos pela Congregação dos Cardeais, o corpo é transportado em uma procissão da casa pontifícia à Basílica. Quem preside o rito e a procissão é, mais uma vez, o cardeal Camerlengo. A nova orientação adota em 2024, apenas um único caixão de madeira revestido internamente de zinco.
O mestre das Celebrações Litúrgicas do Sumo Pontífice, então, lê o rogito, ata escrita em latim que relata os principais atos da vida do falecido Papa e, em seguida, estende-se o véu de seda branca sobre o rosto do defunto, que é aspergido com água benta. No caixão, são colocados um saco com as medalhas cunhadas durante o pontificado e um tubo com o rogito, depois de selado com o selo do Departamento das Celebrações Litúrgicas. Cada um desses momentos possui seu significado especial.
O ato de colocar o véu branco sobre o rosto do Papa simboliza a pureza e a santidade. Ilustra a dignidade do ministério que o Santo Padre exerceu, e também a sua passagem: agora ele está separado do mundo, e contempla a beleza do Criador.
O caixão do papa vai para exposição pública.
Terceira estação: no local do sepultamento Ao terminar a missa pública de exéquias, passa-se à terceira estação, composta por dois momentos: Procissão ou Translado do féretro ao local da sepultura (Processione) e Sepultamento do corpo do Sumo Pontífice (Tumulazione della salma del Sommo Pontefice defunto).O corpo é levado até o local da sepultura, onde o cardeal Camerlengo preside o rito de inumação, confiando outra vez o Santo Padre à misericórdia divina.
Em seguida, o caixão de cipreste é posto dentro de um caixão de zinco/chumbo, que é fechado com solda. Do lado de fora, encontram-se as inscrições com o nome do Papa e as datas de seu pontificado. Depois, o caixão é posto dentro de outro caixão de madeira, de carvalho, que também é selado, enquanto os presentes cantam a Salve Regina (oração da Salve Rainhacantada em latim).
Observe que não somente o costume dos três caixões foi abolido, como também houve uma revisão na terminologia utilizada durante as cerimônias fúnebres, com a simplificação dos títulos atribuídos ao papa, enfatizando seu papel como “pastor” e “discípulo de Cristo”, em vez de títulos que o associem a uma figura de poder mundano. Apesar de as normas ainda preverem o sepultamento do Santo Padre falecido na Basílica São Pedro (Vaticano), o Papa Francisco, sem as modificar, expressou seu desejo de ser sepultado em outra basílica, a de Santa Maria Maior, que fica em Roma, fora dos muros do Vaticano.
Todo este ritual é feito em um tempo estimativo entre quatro e seis dias.
Eleição do novo Papa: Após o funeral, o processo de eleição do novo Papa é iniciado. O Colégio de Cardeais, composto por cardeais com menos de 80 anos, é responsável por escolher o sucessor. O Conclave é realizado em uma câmara especialmente preparada para esse momento, onde
os cardeais são isolados até que uma decisão seja tomada. Neste momento, cabe ao mundo católico, elevar súplicas ao Divino Espírito Santo para que o novo Pontífice continue a tarefa de Pedro, confirmar os seguidores de Jesus na fé no ressuscitado.
Não se deve confundir a tarefa do próximo pontífice com aquela de continuar algo que o antecessor iniciou, mas continuar a tarefa confiada pelo Senhor a Pedro, ou seja, apascentar o povo da nova aliança (Jo 21, 15-22).
Fonte: CORBELLINI, G. Leggi e disposizioni dello Stato della città del Vaticano, LUP, Vol. III, Roma 2007.Pio XII, De funere Summi Pontificis, 1939.Francisco, Exsequiarum Romani Pontificis, vol II, 2024.