Investigação da Polícia Civil aponta que Conafer promoveu a inclusão de descontos em 73.108 beneficiários em cerca de quatro meses. Ou seja, aproximadamente 610 novos filiados por dia.
Uma investigação da Polícia Civil do Distrito Federal, iniciada em 2020, identificou que a Conafer, uma das principais entidades investigadas por descontos ilegais em benefícios do INSS, multiplicou o número de associados durante a pandemia de Covid-19.
Entre abril e julho de 2020, em meio à emergência sanitária, a empresa promoveu a inclusão de descontos em 73.108 benefícios previdenciários. Ou seja, aproximadamente 610 novos filiados por dia.
A Conafer foi a entidade que mais aumentou o volume de descontos de aposentados e pensionistas entre 2019 e 2024, em números absolutos. Passou de R$ 400 mil por ano, em 2019, para R$ 57 milhões em 2020 e R$ 202 milhões em 2023, segundo dados da Controladoria-Geral da União (CGU).
O inquérito da Polícia Civil do DF foi aberto em 2020, quase cinco anos antes de o escândalo de fraudes vir a público. À época, a investigação pioneira foi aberta após denúncia de dois aposentados contra a Conafer (entenda mais abaixo).
Para os investigadores, já naquela época ficou demonstrado que os descontos indevidos foram realizados nos benefícios de cidadãos em situação de alta vulnerabilidade, considerando que se tratam de idosos.

Além disso, os valores foram retirados em um período em que a percepção quanto à real motivação dos descontos era mais difícil de ser descoberta, já que as agências do INSS estavam fechadas em razão do distanciamento social imposto pela Covid, também de acordo com os investigadores.
A corporação pontuou, na investigação de 2020, que outro fator relevante era que a população nessa faixa etária possui mais dificuldade quanto à utilização de tecnologias.
Em depoimento à Polícia Civil em março de 2021, o presidente da Conafer, Carlos Roberto Ferreira Lopes, disse que o aumento repentino de descontos tinha sido consequência de uma demanda reprimida no período.
Histórico de condenação
O relatório policial aponta ainda que outro dirigente da confederação, Tiago Ferreira Lopes, já havia sido condenado em uma ação por improbidade administrativa, com enriquecimento ilícito e dano ao patrimônio público.
Segundo o documento, ele estava envolvido anteriormente em outro caso de descontos não autorizados por trabalhadores. Tiago Lopes é irmão do presidente da Conafer.
A entidade chegou a ter o acordo de cooperação técnica, que permite fazer descontos diretamente na folha de pagamento, suspenso pelo INSS em 2020, quando alguns servidores começaram a fazer uma apuração interna. No entanto, a Conafer foi reabilitada dias depois, após mudanças nos procedimentos do INSS.

Por decisão da Justiça do DF, o inquérito da Polícia Civil foi encaminhado à Polícia Federal em 2021. A operação para desarticular o esquema foi deflagrada quatro anos depois, no mês passado.
Denúncia de ameaça
No mesmo inquérito da Polícia Civil, um servidor da diretoria do INSS foi ouvido, em fevereiro de 2021, e relatou que pediu à Conafer as assinaturas dos aposentados autorizando os descontos nos seus benefícios, mas a entidade não as apresentou.
A justificativa dada foi que estavam no meio da pandemia de Covid-19 e não havia funcionários disponíveis para reunir a documentação.
Na mesma época, esse servidor do INSS também denunciou à Polícia Federal que começou a sofrer ameaças de morte depois que iniciou as apurações internas que atingiram a Conafer e outras entidades associativas.
O inquérito da Polícia Civil do DF sobre a Conafer nasceu de denúncias de dois aposentados. O delegado do caso à época chegou a pedir a quebra de sigilo bancário do presidente da entidade.
O juiz da 8ª Vara Criminal entendeu que, no momento em que a quebra de sigilo bancário foi pedida, não havia provas contundentes de que as fraudes eram generalizadas. O juiz, então, negou a quebra de sigilo.
Pouco tempo depois, o inquérito sobre a Conafer foi remetido à Polícia Federal, a pedido da própria Polícia Civil e do Ministério Público do DF, e passou a tramitar perante a Justiça Federal em Brasília.
Procurado por meio da assessoria de imprensa da Conafer, o presidente da entidade, Carlos Roberto Ferreira Lopes, não se manifestou até a publicação desta reportagem.